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O que mudaria na prática com o ‘PL dos agrotóxicos’

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A Câmara dos Deputados aprovou na quarta-feira (9) um projeto de lei que flexibiliza o controle e a aprovação de agrotóxicos no Brasil.

A maioria dos deputados apoiou a mudança – 301 contra 150, além de duas abstenções. Em 2016, esse PL já havia sido aprovado, mas, por ter sofrido alterações recentes, terá agora de voltar ao Senado para uma nova avaliação.

O projeto é alvo de críticas por fragilizar ainda mais uma legislação já considerada fraca por especialistas.

“O texto não cobre as lacunas de fiscalização, monitoramento e reavaliação de produtos, que já são precárias, e ainda retira o pouco de proteção que a população tinha”, avalia a engenheira agrônoma Marina Lacôrte, porta-voz de agricultura e alimentação do Greenpeace Brasil e mestre em ecologia.
Quais são os principais pontos da PL

O projeto de lei 6299/2002 visa que o controle da autorização de novos agrotóxicos no Brasil seja uma missão do MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), tirando a atuação direta do Ministério da Saúde, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), do Ministério do Meio Ambiente e do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais) desse processo.

Se a proposta for aprovada, os órgãos ainda podem emitir pareceres e alertas de risco sobre as substâncias, mas a competência de multar empresas e institutos de pesquisa passaria a ser somente do MAPA.

Nesse caso, o Ministério da Saúde avaliaria questões como o risco contaminação de trabalhadores, da população geral e o nível de segurança sanitária, e os órgãos relacionados ao meio ambiente, a periculosidade dos produtos para a proteção ambiental.

Mas os pareceres não são vetos, e podem ser ignorados.

“O MAPA é quem avalia a eficiência da molécula do ponto de vista agronômico. Além disso, suas aprovações podem estar ligadas a interesses comerciais. Desde governos passados não temos políticos isentos no ministério, mas sim pessoas ligadas à bancada ruralista, que defendem esse modelo agrícola de commodities. É a raposa cuidando do galinheiro”, diz a porta-voz do Greenpeace.

Ela reforça que mesmo que fossem políticos que olhassem para a agricultura de forma conjunta à sociedade e ao meio ambiente, ainda é muito perigoso tirar a autonomia dos outros órgãos.

A BBC News Brasil entrou em contato com o MAPA para obter um posicionamento sobre a composição do ministério e a influência sobre o modelo agrícola e aguarda resposta.

Mudanças recentes no texto

Apesar de a Constituição Federal categorizar esses produtos como “agrotóxicos”, o relator do texto, Luiz Nishimori (PL-PR), altera o termo na lei para “pesticidas”. O deputado justifica a mudança como um acompanhamento das tendências mundiais.

“A nomenclatura científica mundial para os produtos é [a palavra em inglês] ‘pesticides’ e estamos adequando aos demais países. O agro não é tóxico, o que apresenta toxidade são os produtos para combater pestes, pragas e doenças nas plantas. Sem proteção, as ervas daninhas vão danificar as plantas e, sem isso, não temos alimento. O mundo todo utiliza este nome”, disse à BBC News Brasil.

Quando utilizados em florestas e em ambientes hídricos, os agrotóxicos passam a ser chamados pelo texto de “produtos de controle ambiental”, e seu registro caberá ao Ibama.

Na nova versão, a vedação da importação e produção de agrotóxicos restringe-se ao termo generalista de “riscos inaceitáveis”. Atualmente, a lei define a proibição para agrotóxicos que revelem características teratogênicas, carcinogênicas, mutagênicas e causem distúrbios hormonais e danos ao aparelho reprodutor.

A matéria estipula prazos mais rápidos (de até dois anos) para os registros dos agrotóxicos pelos órgãos federais, o que poderia prejudicar estudos toxicológicos mais robustos. Quando não houver manifestação conclusiva dentro dos prazos estabelecidos, o agrotóxico receberá uma autorização temporária.

De acordo com Nishimori, a alteração serve para igualar o Brasil a outros países de mesma importância agrícola, que, segundo ele, costumam começar a usar os produtos com mais agilidade.

“Para avançar cada vez mais, o Brasil precisa ser competitivo e estar nos mesmos patamares de acesso às tecnologias inovadoras no campo.”

Mudanças e riscos

O relator afirma que “quem vai ganhar com este projeto é o consumidor final e a sociedade brasileira”. No entanto, especialistas da área da saúde e do meio ambiente emitem opiniões contrárias, afirmando que a população geral – e o planeta como um todo – tendem a ser prejudicados.

“A questão central dessa mudança no texto é que quem decide o que vai ao não ao mercado é o Ministério da Agricultura. Se a avaliação dos outros órgãos indica alta periculosidade, mas o MAPA decide que o produto é economicamente interessante, ele pode acabar passando”, indica Luiz Cláudio Meirelles, pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz.

Na opinião do cientista, a tendência é que os órgãos que ficariam com menos poder participem cada vez menos dos processos.

“A Anvisa já tem agenda lotada na análise de outros produtos, como medicamentos e vacinas. Será que faz sentido continuar investindo seus esforços em uma área na qual não vai decidir mais nada?”, questiona.

Dessa maneira, avalia Meirelles, fica mais difícil de controlar os riscos à saúde que a população terá a longo prazo, assim como o impacto no meio ambiente.

O Inca (Instituto Nacional do Câncer) aponta que toda a população está suscetível a exposições múltiplas a agrotóxico por meio de consumo de alimentos e água contaminados.

Entre os principais efeitos à saúde, o instituto lista os de nível agudo, como irritação na pele, desidratação, alergias, ardência do nariz e boca, tosse, coriza, dor no peito, dificuldade de respirar, irritação da boca e garganta, dor de estômago, náuseas, vômitos, diarreia, dor de cabeça, transpiração anormal, fraqueza e irritabilidade.

Já entre os efeitos crônicos, que aparecem após exposições repetidas a pequenas quantidades das substâncias por um período prolongado, são relatados os seguintes sintomas, de acordo com a Anvisa:

Dificuldade para dormir, esquecimento, aborto, impotência, depressão, problemas respiratórios graves, alteração do funcionamento do fígado e dos rins, anormalidade da produção de hormônios da tireoide, dos ovários e da próstata, incapacidade de gerar filhos, malformação e problemas no desenvolvimento intelectual e físico das crianças e risco aumentado para câncer (em determinados grupos de agrotóxicos).

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